sábado, 24 de novembro de 2007

A virtude como valor moral

Entrevista com Roberto Romano[1]

O Brasil foi tomado pelos proxenetas ou pelas viúvas da ética. Os proxenetas estão nos palácios: usaram a dita cuja o quanto puderam e, instalados no poder, deram-lhe o bilhete azul. Hoje nem falam mais dela ou com ela. Vivem para outros abraços e braços, com todo prazer. As viúvas ainda não entenderam que a "boa" ética só pode surgir de atos bons, com palavras corretas, em ações de hoje para a frente, tendo em vista o futuro no qual os proxenetas e os sem vergonha não tenham lugar. Para isto, é preciso lutar até o último alento contra os referidos aproveitadores da ética, jamais aceitar com eles "acordos" e quejandos. A oposição brasileira está longe de assumir esta atitude. Ela prefere atacar os aspectos mais conspícuos da ética apodrecida imperante, não construir na prática uma ética concorde com os parâmetros adequados à cidadania republicana. Vejamos: quantos políticos da oposição atual colocam-se contra o foro privilegiado dos políticos. Segundo a resposta a esta pergunta, saberemos se o discurso é para valer ou se tratamos com impostores. É isto aí. This is this and that is that.




A ética é o complexo de comportamentos e valores que marcam a vida cotidiana das sociedades, sendo assumida pelos grupos menores que a compõem, como a família, a escola, as igrejas, os partidos políticos, os setores artísticos, esportivos, técnicos, etc.
Já Platão (autor do mais importante tratado sobre educação, A República ), indica a necessidade de ordenar os ensinamentos familiares (sobretudo os ensinamentos das babás) para que eles não repitam para as crianças juízos e atitudes éticas nocivas ao bem comum.
. A base da tese educacional platônica é a imitação (mimesis).
. Tingir almas é a tarefa dos educadores e pais. E não se educa repetindo textos, normas, etc. Mas se ensinando que o respeito pelos outros seres humanos é a essência da lei. Quem possui a lei na alma, age automaticamente em favor da lei e do dever. Para ele, agir corretamente é natural. É preciso recordar que ética vem do grego “hexis”, que significa “postura, atitude”. Se uma criança “aprende” a se postar corretamente, usando corretamente o seu corpo, a postura certa (anatomicamente) será fácil para ela. Se ela “aprende” que a espinha curvada, o andar torto define as formas corretas, será muito difícil para ela “desaprender” a mudar de atitude.
É bom recordar que o pior inimigo da livre consciência moral é a repetição, tanto de enunciados quanto de atitudes. Repetir enunciados sem captar os seus conteúdos, os transforma em slogans que perdem significação. A sociedade é o “educador ético por excelência”.
Em suma, numa sociedade que perdeu o sentido do respeito, os jovens mandam...porque são jovens, não devido a algum valor elevado. E Platão arremata: também os professores, com medo dos jovens, afirmam as posturas dos jovens, e não as corretas. O medo dos velhos e dos professores faz com que a democracia se dissolva em anarquia, de modo que a luta de todos contra todos apareça como o horizonte maior.
. Resulta que nem os valores éticos da família nem os da escola são respeitados pelo educando. um filósofo importante do século 20, Elias Canetti, chama de “o medo de mandar”. Mas se os pais não mandam, se os professores não mandam, os jovens (cedo ou tarde) caem nas mãos de tiranos que mandam de modo brutal. Esses tiranos podem ser um patrão (individual ou corporativo) ou um “patrão” do tráfico de drogas. Se os pais e os docentes têm medo de dizer “não” aos filhos e alunos, eles preparam tiranos ou escravos.A escola nunca foi, desde a Grécia ou Roma, passando pelos tempos modernos até os nossos dias, a instituição única a determinar a formação ética. Ela divide a tarefa, sobretudo, com a família e as formas de socialização como o esporte, a vida religiosa, as formas artísticas, etc.
Mas a ética não é uma resposta ou várias respostas às interrogações da juventude. Ela é um modo de ser, digamos, dogmático. Quando se age eticamente, opera-se com certezas que se tornaram hábitos e se fixaram como se fossem “naturais”.


[1] ROBERTO ROMANO – Filósofo e professor de Ética e Filosofia Política da Unicamp, Sábado, Julho 15, 2006.Revista Integra de Educação